Um filme que causa polemica quando é exibido tem garantia de
que vai ser assistido por muito tempo. Nesses casos, há dois extremos de fama que a obra pode atingir, ou ele será um tremendo sucesso e acabará
virando um clássico Cult, ou haverá o fracasso e o esquecimento virá da mesma
maneira que a polemica veio.
“Grave”, dirigido por Julia Ducournau, é um dos exemplos de
projeção que se encaixa no primeiro caso (pelo menos para este crítico), pois o
filme traz imagens fortes e ao mesmo tempo consegue quebrar regras de técnica,
servindo como uma nova forma de mostrar algo que não é inédito.
Porque convenhamos, “Grave” não é inédito, a premissa do
filme é simples, Justine, entrou na faculdade de medicina veterinária,
vegetariana, a moça é obrigada a participar de um trote violento na
instituição, quando é obrigada a comer carne. A partir disso, a jovem passa a
ser uma viciada em carne de todos os tipos, inclusive a humana.
A partir dessa pequena sinopse vemos que o filme usa uma
corrente ideológica para criar a sua história, nada demais nisso, mas, o fato
de usar algo atual e de o filme se passar nos dias de hoje, ajuda na construção
da metáfora de que a sociedade quer impor aquilo que os outros devem ser, que a
ideologia de cada um deve ser igual.
E o filme prova isso muito bem, já que a irmã de Justine,
chamada Alexia, apesar de também ser vegetariana, participa e ajuda nos trotes
que os calouros sofrem, assim vemos como Justine é forte, por seguir sua
ideologia e por ao menos tentar se segurar em relação a sua necessidade de
carne.
A técnica do filme é ousada, já que vemos travellings que
costumam significar uma coisa, mas aqui significam outra, assim como alguns dos
ângulos utilizados, que comumente tem um significado diferente do que é
apresentado em outras obras por ai. Se um ângulo de câmera como o plongée (de
cima para baixo), tem como sua principal característica mostrar um personagem
oprimindo o outro, “Grave” mostra o personagem que está por cima sendo oprimido
ao ter que olhar para baixo. Se um enquadramento inclinado mostra um novo ponto
de vista de uma mesma coisa, aqui, ele apenas serve para mostrar a dor que a
protagonista sofre.
Logo, a polemica do filme não está apenas centrada na
história de uma jovem que se torna canibal, e pelas cenas fortes que isso
acarreta, mas também por um uso da técnica que não é igual ao de outras
projeções, mostrando que para saber quebrar convenções de técnica, é preciso
dominar a técnica convencional.
O que é justamente o que a diretora Julia Ducournau faz,
mostrando em seu filme que é possível abordar um gênero como o de terror de uma
forma diferente, usando uma linguagem inventiva e passando uma mensagem
esclarecedora de como a sociedade vem cada vez mais se tornando dominada pelo
ódio, sentimento esse destinado a pessoas que não são iguais as outras pelas
pessoas manipuladas por algo ou alguém.
Assim, a polemica causada por “Grave” é algo inteligente e
necessário ao filme, talvez, essa seja a única forma de as pessoas acordarem e
perceberem que tem algo errado, tão errado quanto a vontade insaciável da
protagonista ou tão errado quanto não sermos nós mesmos.
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