7/08/2025 06:29:00 PM

Crítica: Superman

Crítica: Superman
Superman
Imagem: DIVULGAÇÃO 

Texto escrito por Deivid Purificação 


Se Superman – O Retorno era um filme-tese que surgia nos EUA pós-11 de setembro para questionar se o mundo ainda precisava de um herói, 19 anos depois o filme de James Gunn vem não só para responder que sim, ainda precisamos dele, como também para apontar a quem ele serve.

Gunn ambienta o longa numa realidade bem diferente da dos filmes do Christopher Reeve e do Bryan Singer. Isso aparece tanto no contexto diegético, com um cenário alternativo no qual meta-humanos já existem há mais de cem anos, quanto no contexto cinematográfico. Hoje, o fenômeno dos super-heróis domina as telonas há mais de uma década, e em meio à pressão para inaugurar um novo universo, Kal-El se vê numa crise de dever que espelha perfeitamente o papel do próprio diretor. Ambos precisam definir suas identidades e se perguntar se o que fazem é pelo mundo ou por eles mesmos.

5/19/2025 05:44:00 PM

Crítica: Missão Impossível - Acerto Final

Crítica: Missão Impossível - Acerto Final

Crítica: Missão Impossível - Acerto Final


“Vivemos e morremos nas sombras, por aqueles que conhecemos e por aqueles que não conhecemos.”

Nos últimos anos, Tom Cruise estrelou três filmes de grande orçamento. “Top Gun: Maverick”, “Missão Impossível: Acerto de Contas” e o filme assunto desse texto, “Missão Impossível: Acerto Final”. Os dois últimos dirigidos por Christopher McQuarrie e com envolvimento do ator em sua produção. 


Tanto “Top Gun: Maverick” quanto “Missão Impossível: Acerto Final” falam sobre o tempo e como ele inevitavelmente passa. No filme 8 e último da franquia de ação que iniciou em 1996, Ethan Hunt continua em sua luta para destruir a Entidade, a inteligência artificial que dominou o mundo. Ele e sua equipe estão sem tempo, já que tem apenas três dias para impedir um lançamento em massa de bombas nucleares. 

Hunt nunca foi considerado tão ultrapassado e não confiável como nesse filme, o que é interessante, já que o principal ponto de apoio em um mundo tomado pela tecnologia, seja o nosso ou o do filme, são as pessoas e as relações reais entre elas, pois essa é a única certeza que temos do que está sendo falado e transmitido para nós.

McQuarrie entende que a equipe apenas pode confiar um no outro apesar de cada um ter os seus próprios interesses. Eles não têm opção, ou confiam neles mesmos e nos sentimentos deles e dos companheiros (que são muitos, mas principalmente medo, tensão e apreensão) e usam isso como arma para salvar o mundo ou eles morrem sem confiar nas pessoas ao redor e no que estão sentindo.

E é justamente nessa confiança que entra o silêncio, tão bem utilizado pelo diretor em “Acerto de Contas”. Se no filme anterior a ausência de diálogos em certas cenas representava um roubo ou uma mudança na ação - a cena de Roma, por exemplo - em “Acerto Final” ele representa a tensão que a ação constrói e a confiança que a equipe tem neles mesmos.

Crítica: Missão Impossível - Acerto Final

Tal qual Robert Bresson em “O Batedor de Carteiras”, o silêncio é usado para trazer o impacto do barulho quando esse surge. A confiança da equipe é toda colocada a prova na cena do mergulho, que além de longa, é toda silenciosa, ali sentimos (o público) junto com Ethan e equipe, a tensão que está inserida naquele ambiente. Precisamos confiar nele para confiarmos na ação e nos envolvermos com o filme.

Essa tensão não era repetida nesse alto nível desde “Missão Impossível: Fallout”, um filme brilhante que é toda uma grande sequência de ação. Em “Acerto final” a ação é concentrada, assim como nos outros filmes da franquia, em uma grande cena, mas a tensão é a mesma do filme 6 devido à falta de tempo que os personagens têm para salvar o mundo. 

O diretor usa muito bem aspectos de outros filmes da franquia, não apenas de Fallout. O terceiro filme da franquia nos apresenta talvez o seu pior capitulo. J.J Abrams não é um bom diretor e tem escolhas altamente questionáveis, uma delas é ter uma grande cena de ação, mas escolher não mostrá-la, ao invés disso vemos dois personagens secundários em um carro esperando Ethan roubar o pé de coelho, o que nos leva a outra escolha ruim, nunca sabemos exatamente o que o personagem está roubando. 

McQuarrie não apenas corrige isso, como traz sentido para a adaptação dessas escolhas dentro da história de confiança que está contando. Ele mostra como é possível fazer uma cena de ação sem o espectador ver a ação - quando Ethan salva Grace (Hayley Atwell) de um torturador e vemos a morte deste pela expressão da atriz e ouvimos os sons - e como o roubo do pé de coelho foi importante, não apenas para Ethan salvar sua esposa, mas também para o futuro da Entidade. 

Esse futuro envolve coisas não hackeaveis e hoje em dia, a única coisa não hackeavel são as pessoas e o único filme da franquia que apresenta algo assim é o primeiro filme. O roubo da lista NOC envolvia não algo super tecnológico ou avançado, mas sim lidar com pessoas e no caso, a pessoa era William Donloe. O seu retorno a saga mostra novamente a ideia de confiança, ele perde a confiança da CIA após o filme 1, toda sua vida muda e continuamente reforça o traço da direção de McQuarrie, entender que contra a tecnologia, o mais importante são as pessoas.

Não vivemos apenas por nós, vivemos principalmente por nós, mas também pelos outros. Vivemos por nossas famílias, amigos, mas também de forma coletiva. Claro que no filme isso é mostrado com o salvar o mundo, mas na vida real isso é muito mais simples, são as coisas pequenas, que vão desde não jogar lixo na rua, ceder um assento no transporte coletivo para alguém que precisa mais do que a gente, coisas do tipo mostram nossa confiança em uma sociedade melhor. 

Todas as missões levaram a essa, assim como as nossas escolhas nos levam a algo. O importante é muitas vezes o meio do caminho, as coisas pequenas dentro dele. Para Ethan Hunt, foi o que ele encontrou na caça (com perdão do trocadilho) constante a bandidos, uma amizade para a vida toda com Luther (Ving Rhames), amores genuínos com Julia (Michelle Monaghan), Ilsa (Rebecca Ferguson nos filmes anteriores) e Grace, confiança com Benji (Simon Pegg), esses pequenos passos na vida dele foram aqueles que realmente importam.

E a vida para esses personagens continua, para o público também continua e mesmo que a franquia tenha acabado, tudo tem que ter um final, ela continuará para sempre no imaginário das pessoas que gostam nem que seja um pouquinho do bom cinema de ação.

4/19/2025 05:22:00 PM

Filmes e séries sobre nada - uma reflexão sobre Killer of Sheep

Filmes e séries sobre nada - uma reflexão sobre Killer of Sheep
Killer of Sheep



A primeira vez que assisti "Killer of Sheep" pensei o que soube depois que muita gente também pensa, que é um filme onde nada acontece, por esse motivo, achei o filme chato, tedioso.

Porém, quando nada acontece é exatamente quando tudo acontece, a vida está no processo e não no objetivo ou fim. E com o passar dos anos percebi estar procurando isso nas coisas que eu vejo.

O filme de Charles Burnett é a obra perfeita sobre “nada”. E acho que ver a vida de Stan por 1h20 é um bom exercício, pois várias dúvidas surgem. O que realmente importa? A união daquela família ou a nossa vontade de ver algo acontecer? Que nesse caso, seria alguma briga entre o casal. Stan dançando com a esposa ou um algo “grandioso” acontecendo?

Nós, como sociedade, sempre esperamos algo grande e incrível e com isso, acabamos esquecendo de que esse algo maravilhoso está nos momentos pequenos entre o começo e o fim. Não a toa, o modo de consumo audiovisual mudou, porque o espectador perdeu a paciência com o processo e se tornou mais ansioso.

Séries muito comuns nos anos 2000, como Lost, Gilmore Girls, O.C, que usavam fillers para o espectador ver o processo daqueles personagens, o crescimento ou não deles, o caminho percorrido e que tem mais de 10 episódios por temporada, deram lugar a produções onde “tudo” acontece, mas esquecemos desse “tudo” logo após acabarmos de assistir.

Killer of Sheep



E essas séries, assim como “Killer of Sheep” remontam a esse tempo onde nós como pessoas e espectadores nos importavamos mais com o caminho do que com aquilo que acontece no final dele. 

Os meninos brincando na rua e correndo entre os prédios, a dinâmica do trabalho, onde inevitavelmente nos perguntamos “quem é o assassino (Killer) e quem é a ovelha? (sheep)”, a ida a corrida que dá errado, mesmo nas falhas há pequenas alegrias que Burnett nos mostra com maestria.

Lembro até hoje de quando o final de “How i met your mother” foi ao ar. O episódio final dizia em sua mensagem que o processo vale mais que o final dele e o público achou isso ridículo, porém, por mais que a série seja ruim, a mensagem está certa, o final dura segundos, o processo dura muito mais tempo.

Killer of Sheep



É interessante como Charles Burnett realmente foi um precursor nessa forma de contar histórias e mais do que isso, usar a cidade de Los Angeles para contar essa história e principalmente, uma família e vizinhança negra. Não é um processo e um “nada” qualquer que vemos, é algo específicamente negro, muito próximo ao que acontece em bairros periféricos do Brasil.

O mais legal? Felizmente Burnett foi um precursor e não o único a contar histórias do tipo através de uma família negra. Hoje em dia temos a Filmes de Plástico com filmes como “Ela volta na quinta”, “O dia que te conheci”, “Marte Um”, onde vemos esse cotidiano e as pequenas alegrias e tristezas contidas ali. 

Stan foi sim a origem, mesmo que inconscientemente, de personagens como Ryan Atwood, Rory Gilmore, todos aqueles na ilha em Lost, mas mais que isso ele foi o ponto de partida inicial de Zeca, Deivinho, Hirayama (Dias Perfeitos) e vários outros personagens em filmes e séries sobre “nada”.

E tudo isso, é só parte do processo audiovisual e não o final dele. Talvez nós nem estejamos aqui para ver esse final, eu espero que não tenha final, porém o começo foi com Stan, Charles Burnett e seu “Killer of Sheep”.

4/12/2025 05:59:00 PM

Cidade dos sonhos, mudanças e fé

Cidade dos sonhos, mudanças e fé
A primeira vez que assisti a “Cidade dos Sonhos” foi há muitos anos atrás, eu não me lembro exatamente quando foi, mas tenho na memória três coisas: a fatídica chave azul tão importante para o filme, a cena de Rebekah Del Rio cantando “Llorando” e que apesar de não ter entendido nada, eu adorei.

Adorei pelo o que vim a perceber anos depois: cinema e principalmente cinema do Lynch, não é de entender, é de sentir. Então, fazer uma revisão, em 4k, numa sala de cinema anos depois da primeira vez, foi uma experiência que eu gostaria de ter tido antes.

Todos nós sonhamos. E em nossos sonhos vivemos uma experiência de fé, um salto de fé diria. Saltamos no meio de algo gerado por nosso inconsciente, pode ser uma vontade, um desejo reprimido, uma frustração, uma característica ruim nossa que tentamos reprimir a todo custo, pode ser qualquer coisa.

Acredito que nossos sonhos são uma experiência de fé do nosso inconsciente. Nós temos fé que o nosso sonho nos levará a um lugar melhor, caso nos deixemos e sempre deixamos, o sonho e os sentimentos comandarem a gente. Mas, o corpo não necessariamente quer isso e aí acordamos.


Mesmo quando acordamos algo fica em nós, uma sensação, memória, música. Somos controlados por isso, independente do motivador do sonho, é algo que nos controla e nos motiva de alguma forma.

Para Betty (Naomi Watts) o motivador é uma frustração, para Lynch o sonho é a ferramenta para expor os nossos sentimentos mais profundos. E penso que em “Cidade dos Sonhos” alguns desses nossos sentimentos são trazidos à nossa frente e por isso é uma experiência muito pessoal e divisiva para cada um.


Vejo muitas pessoas tentando entender o filme, para mim não faz sentido, não entendemos o nosso sonho e a partir do momento que estamos vendo o sonho de outra pessoa, não vamos entender também. 

Já vi muitas pessoas achando o filme lento ou tedioso, o que também não entendo, já que os sonhos para gente passam rápido enquanto acontecem, mas eles são predominantemente lentos. 

Como disse, acho sonhos um salto de fé e esse filme mostra como somos capazes de saltar e descobrir coisas sobre nós mesmos caso tratemos a vida da mesma forma que tratamos o sonho. 

É preciso acreditar na ideia de Lynch para gostar desse filme e é preciso ter um pouco de fé nos sonhos e em si mesmo para ficarmos envolvidos e deixarmos a vida acontecer. 

Talvez, quando eu assisti “Cidade dos Sonhos” a primeira vez, eu ainda não era maduro o suficiente para entender as coisas e agora não sei se tenho o bastante, mas isso é que é bom. Os filmes não mudam, mas quando revemos os filmes, somos nós que mudamos e talvez esse seja o maior efeito da arte em nós, a auto reflexão.

P.S: Muito bom como Lynch coloca músicos que gosta em seus trabalhos. Rebekah Del Rio nesse filme, Julee Cruise, Nine inch nails, Chromatics, Lissie em Twin Peaks. É uma forma de mostrar respeito e admiração pelo trabalho da pessoa, principalmente levando em conta que vivemos numa época onde IA é capaz de copiar conteúdo dos outros.

1/29/2025 05:30:00 PM

A chuva em Seven - Sete pecados capitais

A chuva em Seven - Sete pecados capitais

“Não quero viver em um lugar que a apatia é alimentada e incentivada”.

Na Nova Iorque de David Fincher em “Seven” sempre chove e não sei até que ponto isso é por acaso.

Não digo isso pela história do filme, uma investigação sobre um serial killer que mata de acordo com os sete pecados capitais, mas sim pela história de Somerset (Morgan Freeman), quer dizer, pelo o que sabemos dela.


O que mais sabemos sobre ele são duas coisas: ele é sozinho e odeia Nova Iorque. Como alguém que não é o maior fã de São Paulo, entendo o sentimento. Ele está anestesiado, então a apatia é alimentada e se torna uma ferramenta para conseguir sobreviver, não viver.

Talvez Fincher odeie Nova Iorque tanto quanto seu personagem principal e talvez já tenha se sentido igual Mills (Brad Pitt) a respeito da cidade, esperançoso, emotivo, animado e assim como aconteceu com Somerset, a cidade o destruiu.

Então, na Nova Iorque chuvosa de Fincher, a história se desenrola. Em nenhum momento faz sol, ou para de chover, chove o tempo todo. A chuva oprime os personagens dentro de sua investigação e os faz nunca esquecer do peso daquele trabalho.

A chuva acompanha a violência do crime ou seja, é mais pesada dependendo do tipo de assassinato. Como a cena da gula ou a cena da luxúria. A chuva é mais leve na medida que a investigação avança, como se a liberdade, a paz, alguma esperança, estivesse a caminho, mas a chuva forte sempre volta.

Mesmo assim, Somerset e Mills continuam investigando, tentando, vivendo. De alguma forma, por mais que o peso exista, principalmente sobre Somerset, é a investigação que os mantém vivos, ativos, com desejo pela vida.

Um dia ouvi uma conversa onde duas pessoas discutiam sobre Seven, uma delas disse “o suspense no filme não existe, não para o público ao menos, nós já sabemos quem é o assassino”.

Realmente, sabemos, porém ao ouvir isso, eu pensei imediatamente na chuva e na revisão também. O suspense maior para mim nunca foi quem era o assassino, mas era quando a chuva ia parar, se é que ia parar, porque aquela chuva o tempo todo me causava (ainda causa) ansiedade, o peso daquela cidade se instalou em mim de certa forma com aquela chuva e com o som dela.

É como se fosse o capítulo de Cem anos de Solidão quando chove sem parar em Macondo por quatro anos. Quando a chuva ia parar? Porque está chovendo daquele jeito? Como as pessoas conseguem viver com aquela chuva?

Assim como em Seven, não sabemos, mas os detetives continuam, mesmo sem querer, mesmo com o peso da chuva se misturando com o peso da investigação e com as suas preocupações pessoais, Somerset vai se aposentar? Tracy (esposa de Mills, vivida por Gwyneth Paltrow) continuará com sua gravidez?

Nesse momento, quando as dúvidas e o peso se tornam insuportáveis, a investigação avança, a chuva para e o sol abre. A solução para os casos chegou de forma inesperada, tanto para o público, quanto para os detetives.

Somos enganados (ou foi só eu mesmo?) por Fincher. Quando o sol abre, penso que teria uma esperança, o caso seria resolvido sem problemas e bom, a vida continuaria, Somerset se aposentaria, Mills continuaria morando com sua esposa em Nova Iorque.

Mas se a chuva era ruim, o sol e o calor são ainda piores. No filme, eles representam a concretização do medo, do “sermão” de John Doe (Kevin Spacey), da loucura de Mills e da solidão de Somerset. A surpresa que o sol traz é indescritível e prova uma coisa, a cidade grande sempre dá um jeito de oprimir.

Somerset diz a fala que inicia o texto sobre apatia, mas infelizmente, esse sentimento é necessário para conseguir viver em qualquer cidade grande, seja ela qual for. O ambiente ao nosso redor é cada vez mais destrutivo e excessivo, a apatia é uma forma de nos protegermos.

Somerset cita Hemingway, “o mundo é um lugar bom e vale a pena lutar por ele. Eu concordo com a segunda parte”.

Eu também, Somerset, eu também. 
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