7/08/2025 06:29:00 PM

Crítica: Superman

Superman
Imagem: DIVULGAÇÃO 

Texto escrito por Deivid Purificação 


Se Superman – O Retorno era um filme-tese que surgia nos EUA pós-11 de setembro para questionar se o mundo ainda precisava de um herói, 19 anos depois o filme de James Gunn vem não só para responder que sim, ainda precisamos dele, como também para apontar a quem ele serve.

Gunn ambienta o longa numa realidade bem diferente da dos filmes do Christopher Reeve e do Bryan Singer. Isso aparece tanto no contexto diegético, com um cenário alternativo no qual meta-humanos já existem há mais de cem anos, quanto no contexto cinematográfico. Hoje, o fenômeno dos super-heróis domina as telonas há mais de uma década, e em meio à pressão para inaugurar um novo universo, Kal-El se vê numa crise de dever que espelha perfeitamente o papel do próprio diretor. Ambos precisam definir suas identidades e se perguntar se o que fazem é pelo mundo ou por eles mesmos.


A resposta que o filme encontra, tanto para o personagem quanto para o diretor, parece vir do mesmo lugar, embora em níveis diferentes.

Para Gunn, ela surge na forma como ele contorna suas obrigações de apresentar o mundo e o conflito com leveza, construindo um universo orgânico em que todos os coadjuvantes têm algum arco. Mesmo os mais superficiais, como o Lanterna Verde Guy Gardner tentando emplacar o nome do grupo, funcionam ao menos como piada. Já para o Superman, a jornada é mais complexa. Ele precisa enfrentar uma série de desafios, além da opinião pública voltada contra ele, das consequências de interferir em uma guerra e de uma crise iminente no seu relacionamento.

Diante de tantos núcleos, seria fácil imaginar que o filme se tornasse inchado. Mas o roteiro e a direção conseguem ser surpreendentemente flexíveis, distribuindo bem o personagem entre os diferentes focos da narrativa e oferecendo um tom distinto para cada um deles. Nesse sentido, é o filme mais maduro de James Gunn. Ele equilibra com cuidado tanto cenas intimistas, como a conversa com Lois — em que os atores se desestabilizam emocionalmente pouco a pouco, numa das melhores cenas do filme — quanto uma abordagem de ação que flerta com a animação.

Em vários momentos, o diretor estica os atores com lentes angulares e permite que seus corpos guiem a câmera em movimentos abruptos. Em uma cena, por exemplo, Superman voa com tanta velocidade que a câmera o percorre como se ele estivesse sendo esticado. Em outra, ao desferir um golpe que desloca seu ombro, o movimento da câmera se quebra junto com o osso. Esse tipo de solução visual reforça algo que Gunn articula bem: a violência coexistindo com a caricatura.

E por que comecei esse texto mencionando O Retorno? (Aqui vai um leve spoiler do início do novo filme, mais como ponto de partida que revelação). Logo na abertura, vemos a opinião pública se voltar contra o Superman depois que é revelado que seus pais biológicos não o enviaram à Terra por altruísmo, mas com a intenção de dominá-la. É um retcon bobo, mas essencial para o arco do herói.

A partir daí, o filme levanta a pergunta central: qual o verdadeiro papel de Superman? Dado o contexto geopolítico em que os Estados Unidos perdem influência como potência global, essa dúvida pode ser lida como um espelho da própria crise de identidade norte-americana. Diante disso, qual caminho seguir? O ideal colonizador, herdado de uma aristocracia alienígena, ou algo novo que se construa a partir das informações disponíveis?

Essa tensão atravessa toda a narrativa. A quem o herói serve?

Gunn responde, talvez de forma até ingênua, que ele serve ao mundo. Superman interrompe uma guerra não porque seu país exige, e nem por herança imperialista, mas porque um povo, diante da opressão, precisa dele.

Sim, é uma solução simples para uma questão muito mais complexa. Mas em um mundo cada vez mais radicalizado, com ataques constantes a grupos minoritários e discursos de ódio tomando o centro do debate público — e numa história em que um bilionário usa macacos em universos de bolso para postar tweets contra quem discorda dele — talvez a resposta mais ingênua seja também a mais sincera.

Texto escrito por Deivid Purificação 

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