Nos últimos anos, Tom Cruise estrelou três filmes de grande orçamento. “Top Gun: Maverick”, “Missão Impossível: Acerto de Contas” e o filme assunto desse texto, “Missão Impossível: Acerto Final”. Os dois últimos dirigidos por Christopher McQuarrie e com envolvimento do ator em sua produção.
Tanto “Top Gun: Maverick” quanto “Missão Impossível: Acerto Final” falam sobre o tempo e como ele inevitavelmente passa. No filme 8 e último da franquia de ação que iniciou em 1996, Ethan Hunt continua em sua luta para destruir a Entidade, a inteligência artificial que dominou o mundo. Ele e sua equipe estão sem tempo, já que tem apenas três dias para impedir um lançamento em massa de bombas nucleares.
Hunt nunca foi considerado tão ultrapassado e não confiável como nesse filme, o que é interessante, já que o principal ponto de apoio em um mundo tomado pela tecnologia, seja o nosso ou o do filme, são as pessoas e as relações reais entre elas, pois essa é a única certeza que temos do que está sendo falado e transmitido para nós.
McQuarrie entende que a equipe apenas pode confiar um no outro apesar de cada um ter os seus próprios interesses. Eles não têm opção, ou confiam neles mesmos e nos sentimentos deles e dos companheiros (que são muitos, mas principalmente medo, tensão e apreensão) e usam isso como arma para salvar o mundo ou eles morrem sem confiar nas pessoas ao redor e no que estão sentindo.
E é justamente nessa confiança que entra o silêncio, tão bem utilizado pelo diretor em “Acerto de Contas”. Se no filme anterior a ausência de diálogos em certas cenas representava um roubo ou uma mudança na ação - a cena de Roma, por exemplo - em “Acerto Final” ele representa a tensão que a ação constrói e a confiança que a equipe tem neles mesmos.
Tal qual Robert Bresson em “O Batedor de Carteiras”, o silêncio é usado para trazer o impacto do barulho quando esse surge. A confiança da equipe é toda colocada a prova na cena do mergulho, que além de longa, é toda silenciosa, ali sentimos (o público) junto com Ethan e equipe, a tensão que está inserida naquele ambiente. Precisamos confiar nele para confiarmos na ação e nos envolvermos com o filme.
Essa tensão não era repetida nesse alto nível desde “Missão Impossível: Fallout”, um filme brilhante que é toda uma grande sequência de ação. Em “Acerto final” a ação é concentrada, assim como nos outros filmes da franquia, em uma grande cena, mas a tensão é a mesma do filme 6 devido à falta de tempo que os personagens têm para salvar o mundo.
O diretor usa muito bem aspectos de outros filmes da franquia, não apenas de Fallout. O terceiro filme da franquia nos apresenta talvez o seu pior capitulo. J.J Abrams não é um bom diretor e tem escolhas altamente questionáveis, uma delas é ter uma grande cena de ação, mas escolher não mostrá-la, ao invés disso vemos dois personagens secundários em um carro esperando Ethan roubar o pé de coelho, o que nos leva a outra escolha ruim, nunca sabemos exatamente o que o personagem está roubando.
McQuarrie não apenas corrige isso, como traz sentido para a adaptação dessas escolhas dentro da história de confiança que está contando. Ele mostra como é possível fazer uma cena de ação sem o espectador ver a ação - quando Ethan salva Grace (Hayley Atwell) de um torturador e vemos a morte deste pela expressão da atriz e ouvimos os sons - e como o roubo do pé de coelho foi importante, não apenas para Ethan salvar sua esposa, mas também para o futuro da Entidade.
Esse futuro envolve coisas não hackeaveis e hoje em dia, a única coisa não hackeavel são as pessoas e o único filme da franquia que apresenta algo assim é o primeiro filme. O roubo da lista NOC envolvia não algo super tecnológico ou avançado, mas sim lidar com pessoas e no caso, a pessoa era William Donloe. O seu retorno a saga mostra novamente a ideia de confiança, ele perde a confiança da CIA após o filme 1, toda sua vida muda e continuamente reforça o traço da direção de McQuarrie, entender que contra a tecnologia, o mais importante são as pessoas.
Não vivemos apenas por nós, vivemos principalmente por nós, mas também pelos outros. Vivemos por nossas famílias, amigos, mas também de forma coletiva. Claro que no filme isso é mostrado com o salvar o mundo, mas na vida real isso é muito mais simples, são as coisas pequenas, que vão desde não jogar lixo na rua, ceder um assento no transporte coletivo para alguém que precisa mais do que a gente, coisas do tipo mostram nossa confiança em uma sociedade melhor.
Todas as missões levaram a essa, assim como as nossas escolhas nos levam a algo. O importante é muitas vezes o meio do caminho, as coisas pequenas dentro dele. Para Ethan Hunt, foi o que ele encontrou na caça (com perdão do trocadilho) constante a bandidos, uma amizade para a vida toda com Luther (Ving Rhames), amores genuínos com Julia (Michelle Monaghan), Ilsa (Rebecca Ferguson nos filmes anteriores) e Grace, confiança com Benji (Simon Pegg), esses pequenos passos na vida dele foram aqueles que realmente importam.
E a vida para esses personagens continua, para o público também continua e mesmo que a franquia tenha acabado, tudo tem que ter um final, ela continuará para sempre no imaginário das pessoas que gostam nem que seja um pouquinho do bom cinema de ação.
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