8/27/2018 12:52:00 AM

Crítica: Hereditário

Hereditário
Imagem: Diamond Films / DIVULGAÇÃO

Ao ver “Hereditário”, dirigido por Ari Aster, fica muito claro que não se trata de um filme de terror qualquer, o proposito dele, pelo menos por um momento é diferente do jumpscare puramente comercial, porém, devido a sua duração, o roteiro sofre para preencher lacunas necessárias em qualquer obra.

Dirigido e roteirizado por Aster, acompanhamos a história da família Graham, Annie (Toni Collette), acaba de perder a mãe e toda a família desde os filhos Peter (Alex Wolff) e Charlie (Milly Shapiro) até o marido Steve (Gabriel Byrne), sentiram a morte dela de formas diferentes, porém, quando a filha vem a falecer, toda a relação já em crise, piora.


Essa relação e a deterioração dela são o ponto alto do filme. A obra ganha em peso, tanto como terror, quanto como estudo de personagem, quando o foco é a família e não o lado espiritual, já que a mãe de Annie acreditava na existência de espíritos e queria que os filhos e netos também acreditassem.

O primeiro e segundo ato servem para mostrar essa deterioração familiar, pegando o público de surpresa devido a crueldade com que certas coisas são ditas de forma abrupta, principalmente no que diz respeito a Annie e Peter, já que os dois não se dão bem devido ao sonambulismo dela, que prejudicou a relação deles no passado.

Esses diálogos são a força do roteiro, porque são cruéis ao mesmo tempo em que são reais, Annie usa as palavras como arma, sabe que elas ferem Peter e não se importa nem um pouco com o estado do filho, essa crueldade, que é agravada devido ao seu atual estado psicológico e ao sonambulismo, são bem explorados quando a obra trata a culpa que ela sente.

Pois, se tem algo que é de fato hereditário naquela família é a culpa, a mãe de Annie se sente culpada pela morte do filho, o que pode de fato ter gerado a doença dela – ao contrário do que o filme mostra – Annie se sente culpada pela morte da mãe, o que pode ter gerado o retorno do sonambulismo desta e atitudes prejudiciais a vida da família, Peter se sente culpado pela morte da irmã e por não se dar bem com a mãe, o que pode ter gerado a crise que ele teve, ou seja, é um ciclo vicioso e variado em sua forma.

Mas, se estas hipóteses são bem construídas em um segundo ato brilhante, que explora ao máximo a atuação incrível de Toni Collette e a ótima atuação de Ann Dowd - mesmo com a sua personagem sendo mal desenvolvida pelo roteiro -, o terceiro ato pega tudo isso e usa para se render ao jumpscare barato e bobo, apenas para amarrar as pontas soltas correndo e terminar o filme.

Até porque, como Annie descobriu a ligação da mãe e de uma determinada personagem apenas por tapetes? Como surge um espirito possuidor exclusivamente do corpo masculino, do nada, em um corpo feminino? Como Annie, deixa sua mãe tomar conta da criação da filha mais nova? Apenas por causa do controle de sua mãe? Ou pelo fato do sonambulismo que a afastou dos filhos?

Essas perguntas são respondidas de forma boba, com justificativas pobres e que não condizem com o ótimo nível técnico da obra, a fotografia está constantemente ligada aos figurinos de Annie e o uso de jump cuts para ilustrar passagens de tempo é exemplar, os movimentos de câmera são fluídos e buscam sempre mostrar na cena algo que fica oculto no começo, mas que é relevante no fim desta, criando pequenos cliffhangers a cada sequência.

Fora que a atuação de Toni Collette é brilhante, tanto pela construção da personagem, quanto ao estabelecimento desta como motor do filme, se o roteiro é falho e tem várias brechas (mais do que as apresentadas acima), Collette consegue transpô-las para criar uma personagem cruel o tempo inteiro, seja devido ao aspecto mental, ou apenas pela vontade de ser cruel.

Assim, Ari Aster cria um filme de terror que funciona em determinados momentos devido a sua boa direção, mas que poderia ter sido perfeito se durasse uns 30 minutos a menos, sendo mais enxuto no roteiro e mais impactante psicologicamente do que visualmente, pois as relações familiares seriam de fato o terror do filme, estas sendo centradas na atuação de Collette e não teríamos visto um terceiro ato bobo, apressado e previsível.

Aster mostra potencial com seu primeiro longa, acredito que valha a pena aguardar os próximos trabalhos do rapaz.

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