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This critic is part of Nashville Film Festival 2021 coverage
Escrever sobre um filme como “Flee” é um desafio, pois
sentir empatia pela história de Amin e se colocar no lugar dele é algo
simples, o que não é simples é passar de fato a ideia da obra, pois a não ser
que você tenha passado por uma situação similar a do protagonista, é impossível
fazer jus a trajetória dele através de palavras.
A história de Amin é uma que sabemos ainda ocorrer no mundo.
Ele e sua família fogem do Afeganistão devido a guerra nos anos 80. Amin, seu
irmão mais velho, sua mãe e duas irmãs, precisam sair de casa para
sobreviver e seu pai está desaparecido. O menino – o mais novo de todos – conta
a sua história para o diretor, Jonas Poher Rasmussen, e encara o passado pela
primeira vez.
Esse é o maior desafio dele - e o filme ser em animação expõe isso de maneira simples -, não que ele tenha vergonha de quem é ou de sua história, mas, por sobrevivência, ele teve que esquecer o passado e se imergir no presente sem pensar em sua família. Amin, um menino que sempre soube ser gay, como o próprio diz, é uma pessoa que teve que usar o esquecimento (de quem é e das pessoas importantes para ele) como modo de sobrevivência, caso contrário, ele não teria passado pelo retratado na obra.
Isso é triste. Vemos, por uma hora e meia, uma pessoa contando
tudo aquilo que teve que esquecer para conseguir ter o mínimo, relatando o sacrifício
que seus irmãos fizeram para a mãe sobreviver e para ele conseguir ter
alguma coisa próxima de liberdade, pois a liberdade de fato ele até
conquistou, mas essa liberdade não é completa caso a família dele também não
esteja livre.
É tão relativo ser livre. Em uma das cenas cruciais do filme
– quando ele revela algo importante – “Flee” nos engana. Pensamos que o local onde
ele foi levado é um outro lugar, um que para Amin representaria algo não
desejado por ele, próximo de uma prisão ideológica, e vemos que não, que o
engano foi algo bom, representou a primeira chance que Amin teve de liberdade.
Eu sei que pode ser que esse texto esteja muito narrativo,
mas não tem como passar a ideia de liberdade quando nunca se teve situações as
quais testassem sua liberdade da mesma maneira que Amin teve. Claro que todos
nós, principalmente quem faz parte das minorias qualitativas criadas pelo
sistema, passamos por situações de cerceamento, que podem se dar de diversas
formas.
Mas, comparado a Amin, nossas situações (ou ao menos as
minhas, para ser justo), se tornam simples e no meu caso, particularmente
bobas. Nunca vou sentir o provável alívio sentido pelo protagonista, porque
nunca passarei por aquela situação em especifico e que foi a construtora desse alivio. Esse sentimento pode chegar até mim e outras pessoas
de outras formas, mas nunca dessa maneira.
E isso é bom, não se enganem ou ao menos não se deixem enganar. Tenho certeza de que não é recomendável ter que esconder o seu passado de si mesmo e tenho mais certeza ainda que passar por boa parte do que Amin passou sozinho, também não é nada saudável. Por um lado, é bom que ele conseguiu, mesmo a liberdade sendo parcial e mesmo ele querendo a sua família ao lado. Por outro lado, bom que ele conseguiu contar essa história para alguém, talvez uma das piores coisas dentro de tudo aquilo tenha sido guardar várias coisas para si e com esse filme, talvez um ciclo tenha se fechado para ele, por mais que um deles talvez nunca se feche de todo.
Texto que faz parte da cobertura da edição 2021 do Festival de cinema de Nashville
This critic is part of Nashville Film Festival 2021 coverage
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