Imagem: DIVULGAÇÃO |
No primeiro momento de “Duna”, confesso ter ficado assustado, pois lembrei da adaptação de David Lynch, sabotada pelo estúdio e por isso um fracasso. Isso porque os inícios de ambos os trabalhos são bem similares: narrações em off inúteis, de uma personagem relevante mas não aparente naquele momento e a narração desaparece da obra, o que a torna completamente irrelevante.
Porém, se no filme de Lynch, o estúdio prejudicou ao não
deixar o diretor ter o corte final, na adaptação de Villeneuve, isso não
ocorreu e foi apenas uma escolha ruim, corrigida em seguida no decorrer da
jornada de Paul Atreides (Timothee Chalamet), um jovem inteligente e adequado a
uma profecia messiânica quando vai junto com seus pais Duque Leto (Oscar Isaac)
e Lady Jessica (Rebecca Ferguson) para Arrakis, popularmente conhecido como
Duna, um planeta desértico que abriga a Especiaria, substância mais valiosa do
universo. Isso gera uma guerra entre os Atreides e os Harkonnen, antigos
“donos” do planeta.
Villeneuve organiza a sua adaptação (Duna é um livro escrito
por Frank Herbert) de maneira interessante, tanto para quem leu o livro – como
eu – quanto para o público que não leu. As informações de uma obra complexa e
com termos criados pelo próprio Herbert são importantes para o filme, pois a
jornada messiânica de Paul depende disso.
Se por um lado, Villeneuve “erra” na disposição de algumas
dessas informações no filme, principalmente na primeira hora, na segunda hora,
o filme recupera o folego, ganha ritmo com os acontecimentos e se beneficia da
organização anterior. A primeira hora mantem a projeção viva devido as atuações
de um elenco estrelado, mesmo que essa hora provavelmente agrade ao espectador
por outros motivos.
Pois, se no livro tudo é filosófico, no filme, obviamente,
tudo é visual. Vemos o medo de Lady Jessica no rosto de Rebecca Ferguson, em
uma atuação que se aproveita ao máximo da melhor personagem da história.
Extremamente inteligente e capacitada, Jessica passa as dúvidas em relação ao
futuro de Paul, o medo em relação a jornada e das visões que ele tem de maneira
efetiva para o espectador.
Sim, Paul é um jovem inteligente e com dotes de presciência.
As visões dele dão vazão as ideias de Villeneuve, mostram a importância daquela
guerra e o que ela representa politicamente, ao vermos o que Paul vê entendemos
que ter aquelas capacidades não é o suficiente se dentro dele há toda a
confusão característica do crescimento.
Nessa confusão reside os melhores momentos do filme e as
construções do drama de Villeneuve. As dúvidas do protagonista se tornam nossas
dúvidas, da mesma maneira que o medo sentido por Jessica se torna nosso medo.
Na obra de Herbert lemos tudo isso e novamente, no cinema temos que ver isso,
dentro do possível Villeneuve foi capaz de transmitir essa sensação para o
espectador.
Por que na segunda hora o filme cresce? Porque Villeneuve
deixa de se preocupar com as explicações de termos e tramas que envolvem
aqueles personagens e passa a focar na jornada de Paul para se tornar o
messias. O foco em um ponto fez bem ao filme, o ritmo acelera com a ação das
lutas, com a confusão do personagem e com o entendimento do espectador que o
que estamos assistindo não acaba ali.
Sendo que essa confusão e a compreensão de que aquele não é
o fim, foi criada em nós na medida que vemos as visões de Paul. O protagonista
vê coisas que sabemos que não vão acontecer imediatamente e vê personagens que
sabemos que não terão papel relevante agora, mas sim, no futuro. Essa
construção de curiosidade dentro de nós faz com que a adaptação de Villeneuve e
a ideia que ele tem dos livros (que claramente leu) seja atrativa.
Essa construção passa pelo som, o filme usa e abusa do som
alto para transmitir várias coisas, mas, principalmente para transmitir a Voz –
certas pessoas que podem comandar as ações dos outros apenas usando a sua voz –
o som aumenta quando a Voz é usada e ao unir isso com a luz (monocromática mas
bonita) onde vemos a areia se misturar com a Especiaria, nosso envolvimento com
aquela história cresce de forma considerável.
Por mais que nem tudo seja perfeito, “Duna” é um filme
interessante e que tem a capacidade de manter o público curioso e preso na
fascinante história criada por Herbert. No livro há vários desdobramentos
políticos e filosóficos apaixonantes e eu espero que caso exista uma sequência
desse filme aqui, que a visão de Villeneuve do livro se mantenha na mesma toada,
pois esse novo trabalho do diretor canadense é no mínimo interessante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário