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Texto que faz parte da cobertura da edição 2022 do Festival de cinema de Rotterdam
This critic is part of IFFR 2022 coverage
As ruas vazias de Macau e de Hong Kong passam calma. Vemos uma noite de céu limpo, estradas sem carros, prédios com as luzes
ligadas mas sem ninguém e o nosso protagonista, um estudante de piano, andando
pela cidade, procurando algo que nem ele sabe o que é, mas com a certeza de que
vai encontrar.
Escutamos a voz da diretora e roteirista de “Drifting Petals”,
Clara Law, ao fundo, enquanto a câmera acompanha Jeff, o estudante citado. Ela
também está a procura de alguém, não sabemos quem e talvez nem ela saiba, mas após
conhecer Jeff na Austrália, eles passam a buscar juntos esse desconhecido.
Da mesma forma que pétalas vagam quando caem das arvores no outono, os dois vagam pela cidade, falando com pessoas, discutindo sobre política e claro, falando sobre um futuro que eles podem nem ver, mas querem, de alguma forma, fazer parte. O sentimento preenche a busca constante dos dois.
Todos nós estamos buscando algo que não sabemos o que é,
tentando constantemente, vagando pela cidade grande e encontrando outras
pessoas que também tentam e dessa forma, nos ligando uns aos outros. Essas
constantes tentativas e erros levam, ao menos em teoria, a união das pessoas
que tem algo em comum.
Clara Law usa a história de Jeff e a história do casal de
namorados, de maneira que remonta o filme “Tempting Heart”, dirigido por Sylvia
Chang, onde a diretora conta a história ao mesmo tempo em que a filma, um filme
metalinguístico. Aqui, Law faz algo similar, porque a linha entre a história do
filme dela e a história que ela está trabalhando nesse filme (a da busca) é extremamente
tênue.
Isso não é, de forma alguma, ruim, pois torna o filme algo
próximo de nossas vidas. Não sabemos qual é a nossa história, até que a
vivemos, da mesma forma que não sabemos qual é a história que estamos buscando
contar, até que a contamos. Estamos apenas vagando por aí, cada um em sua cidade
e se dermos sorte, encontramos alguém para nos acompanhar nessa busca.
“Drifting Petals” é um filme que aproxima o público do
cinema ao mesmo tempo em que o afasta. Se aproxima porque vemos as nossas constantes
tentativas (ou não tentativas) de viver em tela, afasta pelo mesmo motivo. Se
ver em tela, principalmente num ponto de vista filosófico, pode ser bem cruel e
nos levar a reflexões para as quais não estamos preparados, da mesma forma que
nos mostrar que sim, estamos preparados, mas não pensávamos isso até então e
isso pode valer até para pessoas que trabalham com arte e não voltam a seus próprios
trabalhos de tempos em tempos, até porque, encarar o que você fez também é um
passo na sua busca pelo desconhecido.
Poucos realizadores têm a mão sensível para ilustrar essa
busca e esse silêncio como Clara Law, que deveria ser mais discutida quando
falamos de cinema.
Texto que faz parte da cobertura da edição 2022 do Festival de cinema de Rotterdam
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