8/05/2022 12:00:00 AM

Fantasia Festival: Next Sohee

Imagem: DIVULGAÇÃO

Texto que faz parte da cobertura da edição 2022 do Festival Fantasia

This critic is part of Fantasia Festival 2022 coverage

Em dado momento de “Next Sohee”, um leve raio de sol encosta no pé da protagonista, Sohee (Kim Si-eun), em uma situação difícil na vida dela. Ela olha esse feixe de luz, dá um leve sorriso e segue sua trajetória, onde nós, espectadores, pensamos ser o final desta, mas é apenas o começo de outra porta que foi aberta pela personagem, por mais que ela nunca saberá disso.

“Se você seguir as drogas, vai encontrar traficantes e viciados, mas, se você seguir o dinheiro, não sabe onde vai parar”, essa frase do detetive Freamon, da série The Wire, se encaixa perfeitamente para a personagem Yoojin, interpretada por Doona Bae, no filme dirigido por July Jung, quando esta começa a investigar a morte de Sohee e descobre ter sido devido as condições de trabalho análogas a escravidão na empresa onde a jovem estagiava para se formar no ensino médio.

 
Jung divide seu filme em duas obras distintas, porém não distantes, onde acompanhamos a trajetória de Sohee e Yoojin de maneira separada, uma após a outra e as ligações da história das duas são parecidas, assim como os nossos caminhos são similares com os caminhos das pessoas ao nosso redor, conhecidas ou não e assim como as duas, há sempre a necessidade de um alivio, de algo que nos faça relaxar.

No caso delas, é a dança. Assim como Faye Wong e Brigitte Lin em “Amores Expressos” tem a ligação pela música e pela loja de ursos de pelúcia que frequentam, assim como você que está lendo e eu somos ligados pelo cinema (caso contrário, você não estaria aqui), Sohee e Yoojin dançam para se manterem vivas e esquecerem de si mesmas, para tentarem ser felizes no final de tudo.

Por mais sóbrio e focado que seja o filme, Jung consegue, através da divisão entre protagonistas e pela ligação delas de maneira inconsciente, transformar a obra não apenas em uma denuncia da relação abusiva entre empregador-empregado e muito menos em uma investigação feita por uma detetive competente e empática, a diretora faz com que seu filme seja um relato de proximidade entre as pessoas.

Yoojin sabe que sua investigação está fadada ao fracasso, porque as instituições não permitem que tal trabalho chegue a seu fim (assim como com detetive Freamon em The Wire), mas ela continua devido a essa ligação misteriosa que ela sente ter com Sohee, mesmo que nunca a tenha conhecido de fato, ela precisa chegar ao fim daquilo, porque ninguém merece passar o que ela passou, ninguém merece ser a próxima Sohee, como diz o título.

Mas infelizmente, teremos várias outras Sohee por aí e não porque não há pessoas que querem impedir que isso aconteça, mas sim, porque estas pessoas encontram outras em seu caminho que as impedem por dois motivos: elas de fato não querem evitar mais tragédias e elas precisam do trabalho e farão de tudo para mantê-lo.

Não consigo culpar as pessoas enquadradas no segundo motivo, nem Yoojin consegue e no diálogo com a chefe do departamento governamental responsável pelos estágios, isso fica muito claro. Muitas pessoas apoiam todo o sistema descrito no filme porque precisam viver mais um dia e para isso, precisam daquele trabalho, naquele local, mesmo que eles tenham plena consciência do que acontece.

Nesse caso em específico, não é culpa das pessoas, é culpa do atual sistema vigente, como a diretora deixa claro em vários momentos, na expressão de seus personagens, na reserva dos policiais subordinados a Yoojin, que fazem o que ela manda, mas não porque querem, eles estão com medo de perder o emprego e no fim, tudo o que fica são as nossas ligações, conscientes ou não, com o próximo.

Tudo é uma dança e no caso do filme, assim como no aprendizado de uma coreografia, é uma sequência de tentativa e erro. Igual a dança inicial de Sohee, ela tenta, cai, tenta de novo e assim sucessivamente. Por mais que ela nunca tenha exposto o ocorrido no trabalho e esse talento (como vemos em relação aos pais), ela não fazia isso por maldade, ela fazia por não querer machucar quem ela ama. E convenhamos, quem ama alguém fez ou faz isso, mesmo que não precise.

Texto que faz parte da cobertura da edição 2022 do Festival Fantasia

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