10/28/2017 04:30:00 PM

Crítica: “O Outro Lado da Esperança” e a empatia em níveis sociais diferentes

O Outro Lado da Esperança
Imagem: Divulgação
Em geral, o diretor finlandês Aki Kaurismaki é um realizador de estilo mais seco, distante do seu público, mesmo abordando assuntos comoventes, causadores de empatia em quem assiste, foi assim em dois dos seus sucessos, “A Moça da Fábrica de Fósforos” onde uma história dura é contada e em “O Homem sem Passado”, projeção muito semelhante a seu mais novo projeto, pela qual o realizador recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro.

“O Outro Lado da Esperança” conta duas histórias acontecendo paralelamente, uma é a de Khaled, refugiado sírio, proveniente da cidade de Aleppo, chega a Finlândia em um barco, e no pais ele pede asilo político. Na segunda, um comerciante de roupas chamado Wikstrom, se separa de sua mulher (devido ao alcoolismo desta) e larga o comércio de vestuários para administrar um pequeno restaurante.




Como em todos os filmes de Kaurismaki, a técnica é rica em abordar de diversos tipos de cenas que, na mão de diretores menos capacitados seriam cortadas na edição final, vide o momento onde o restaurante é inspecionado e em uma outra ocasião na qual Wikstrom está jogando pôquer em um casino. Em ambas, há o uso da câmera parada e dos cortes utilizados para mostrar objetos importantes naquele contexto, no caso do jogo de cartas, eles servem para expor as fichas utilizadas pelos jogadores, e no restaurante, o destacado são os utensílios inspecionados.

Vale o destaque para o uso da montagem paralela, tudo aquilo que acontece antes de Khaled e Wikstrom conversarem pela primeira vez, acontece ao mesmo tempo, e por essa decisão da edição é possível percebemos a brusca diferença do nível de vida dos dois, e isso torna mais comovente os acontecimentos posteriores.

Algo não costumeiro na obra do finlandês é usado aqui: a atualidade. Khaled é a representação dos refugiados, um homem jovem, sem família (com exceção da irmã), que perdeu tudo devido a um soterramento causado por uma explosão no lugar onde morava. Após uma longa viagem, passando por vários países, este decide por pedir asilo na Finlândia devido a este local ser considerado um dos melhores e mais inclusivos para viver.

Então, vemos na obra dois tipos de esperança diferentes daqueles costumeiros no cinema, um homem mais velho (Wikstrom) que decidiu recomeçar a vida, se fosse em outro filme, o ponto de vista abordado seria o de quem ele largou para cumprir seu objetivo, e pelo lado de Khaled, a história mais fácil de vender seria a de sua fuga, e não a de sua busca pela sobrevivência pacifica com outras pessoas.

Porque é este o ponto, Khaled deseja viver, e o filme mostra a procura dele pelos aspectos que fazem da vida algo comum, ou seja, as coisas rotineiras, um emprego, uma casa, lazer, relações com outras pessoas. Logo, quando vemos a procura dele não dar resultado, somos levados a pensar “Mais o que custa dar um emprego a ele? ”, “Qual o mal de deixar ele viver ali? ”, “Qual a diferença dele em relação aos outros pacientes do hospital? ”. Portanto, Kaurismaki leva o espectador a criar empatia, mesmo que quem assista nem perceba isso.

Assim, quando finalmente há o encontro entre Khaled e Wikstrom, vemos todas essas perguntas serem respondidas. Se inicialmente, o dono do restaurante é movido pelo capitalismo e pela oportunidade de conseguir mão de obra barata, ele vai desistindo aos poucos dessa ideia, ao ver que ele e Khaled são iguais, que ambos são refugiados. Logo, há uma mudança no personagem, representante da metáfora para a sociedade capitalista, que prova a possibilidade de todas as pessoas mudarem seu pensamento em relação a inclusão do outro.

Portanto, ao mostrar os diferentes lados da esperança, Aki Kaurismaki mais uma vez prova domínio da técnica e principalmente da empatia. Sentimento esse que é mais fácil ser sentido do que explicado, e a projeção aborda isso de maneira perfeita, principalmente na cena final. Pois, nesta Khaled pode estar sozinho, assim como todos nós estamos, mas, bem lá no fundo, sabemos que ele, assim como nós, leva em seu íntimo a esperança de ser incluído em algo. Por isso é aquele leve sorriso do personagem o fechamento do filme. 

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