Imagem: DIVULGAÇÃO |
This critic is part of Chicago Film Festival 2021 coverage
Em um ano tão difícil quanto o último, imagino que trabalhar
em um filme que fala sobre carinho é um alívio. De certa maneira a arte supre
muitas coisas e em 2020/2021 (talvez 2022), ela está tendo um papel maior do
que se pensava e a presença desta já era bem grande em nossas vidas.
“Drive my car” é justamente o filme sobre carinho que o
público precisa mas não sabe. Dirigido por Ryusuke Hamaguchi (que está em um 2021
fantástico, ao pensarmos que este é um de seus dois filmes no ano), a obra
acompanha Yusuke Kafuku, um ator e diretor de teatro, que após descobrir que sua
esposa (e inspiração) o trai, precisa viver sem ela, pois essa morre após
passar mal abruptamente. Assim, ele passa a dirigir peças e trabalhar em busca
do esquecimento.
O problema é que é impossível esquecer algo como o amor e Yusuke, assim como todos nós, é uma pessoa que precisa de carinho e no meio do seu caminho, ele encontra pessoas que também precisam de carinho e são tão (ou até mais) sozinhas que ele e é esse o ponto no qual o diretor foca.
Sempre há alguém em uma situação pior que a nossa, a questão é se
nós sabemos conviver com essas pessoas. Yusuke teve que reaprender a lidar com
diversos tipos de pessoas. A cena da audição para a peça que ele vai dirigir
deixa isso claro, em uma cidade diferente, vemos pessoas que falam outros idiomas, uma mulher que não
escuta e Yusuke de certa forma oprimido pela obrigação
de lidar com tudo aquilo devido a seu trabalho.
Isso inclui a motorista e principalmente ela. Pois é essa
personagem que representa fisicamente uma série de coisas que Yusuke não sabe
como expressar em si mesmo. A solidão, da qual ela não tem vergonha, o amor
pelo trabalho (que é o que a mantem viva) e claro, o carro vermelho que ela
dirige basicamente durante o filme todo.
Esse carro é de Yusuke, mas ele parece tão natural quando
dirigido por Misaki, que o espectador esquece várias vezes que o carro é dele e
não dela. O ato da direção é importante para a obra como um todo, pois é a
partir desse que nós fazemos várias perguntas para nós mesmos durante as três
horas de duração, nos dirigimos para onde? Qual é o nosso caminho? O que fazer?
Hamaguchi trata essas dúvidas como naturais e principalmente,
como algo pertencente a nós independente da faixa de idade ou nacionalidade. No
filme, há japoneses, sul-coreanos e uma taiwanesa, todos eles de diferentes faixas
etárias e com essas mesmas dúvidas, trabalhadas de maneiras variadas pelo
diretor, que entende esses questionamentos não apenas como meras perguntas, mas
sim como transformadoras de nossas personalidades e rotinas.
Rotinas que mesmo sem nós sabermos, são afetadas pela
presença do outro em nossas vidas e pela nossa constante necessidade desse
outro e do carinho que ele pode oferecer. Os carros, que para Hamaguchi, de
maneira inconsciente, podem representar nossas vidas, nada mais são que uma metáfora
boba para algo sobre o qual não temos nenhum controle.
Porque sim, dirigimos carros e dirigimos nossas vidas, mas
muitas vezes, o destino, a história, o poder dessa história em nós – reparem como
as histórias que Oto (esposa de Yusuke) contava para ele nunca deixam de o
afetar – são aquilo que de fato comandam e nos dirigem, a questão é se nos
deixamos ser dirigidos por fatores externos.
Nem sempre devemos deixar fatores externos terem controle
sobre nós, mas as vezes é inevitável e o jeito é se deixar dirigir e ir até
onde o carro em questão te levar. “Drive my car” nos mostra que na inevitável e
infindável busca por carinho, nós não temos nenhum controle e não há nada de
errado nisso.
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