10/19/2021 12:00:00 AM

Chicago Film Festival: Drive my car

Drive my car
Imagem: DIVULGAÇÃO

Texto que faz parte da cobertura da edição 2021 do Festival de cinema de Chicago

This critic is part of Chicago Film Festival 2021 coverage

Em um ano tão difícil quanto o último, imagino que trabalhar em um filme que fala sobre carinho é um alívio. De certa maneira a arte supre muitas coisas e em 2020/2021 (talvez 2022), ela está tendo um papel maior do que se pensava e a presença desta já era bem grande em nossas vidas.

“Drive my car” é justamente o filme sobre carinho que o público precisa mas não sabe. Dirigido por Ryusuke Hamaguchi (que está em um 2021 fantástico, ao pensarmos que este é um de seus dois filmes no ano), a obra acompanha Yusuke Kafuku, um ator e diretor de teatro, que após descobrir que sua esposa (e inspiração) o trai, precisa viver sem ela, pois essa morre após passar mal abruptamente. Assim, ele passa a dirigir peças e trabalhar em busca do esquecimento.

O problema é que é impossível esquecer algo como o amor e Yusuke, assim como todos nós, é uma pessoa que precisa de carinho e no meio do seu caminho, ele encontra pessoas que também precisam de carinho e são tão (ou até mais) sozinhas que ele e é esse o ponto no qual o diretor foca.

Sempre há alguém em uma situação pior que a nossa, a questão é se nós sabemos conviver com essas pessoas. Yusuke teve que reaprender a lidar com diversos tipos de pessoas. A cena da audição para a peça que ele vai dirigir deixa isso claro, em uma cidade diferente, vemos pessoas que falam outros idiomas, uma mulher que não escuta e Yusuke de certa forma oprimido pela obrigação de lidar com tudo aquilo devido a seu trabalho.

Isso inclui a motorista e principalmente ela. Pois é essa personagem que representa fisicamente uma série de coisas que Yusuke não sabe como expressar em si mesmo. A solidão, da qual ela não tem vergonha, o amor pelo trabalho (que é o que a mantem viva) e claro, o carro vermelho que ela dirige basicamente durante o filme todo.

Esse carro é de Yusuke, mas ele parece tão natural quando dirigido por Misaki, que o espectador esquece várias vezes que o carro é dele e não dela. O ato da direção é importante para a obra como um todo, pois é a partir desse que nós fazemos várias perguntas para nós mesmos durante as três horas de duração, nos dirigimos para onde? Qual é o nosso caminho? O que fazer?

Hamaguchi trata essas dúvidas como naturais e principalmente, como algo pertencente a nós independente da faixa de idade ou nacionalidade. No filme, há japoneses, sul-coreanos e uma taiwanesa, todos eles de diferentes faixas etárias e com essas mesmas dúvidas, trabalhadas de maneiras variadas pelo diretor, que entende esses questionamentos não apenas como meras perguntas, mas sim como transformadoras de nossas personalidades e rotinas.

Rotinas que mesmo sem nós sabermos, são afetadas pela presença do outro em nossas vidas e pela nossa constante necessidade desse outro e do carinho que ele pode oferecer. Os carros, que para Hamaguchi, de maneira inconsciente, podem representar nossas vidas, nada mais são que uma metáfora boba para algo sobre o qual não temos nenhum controle.

Porque sim, dirigimos carros e dirigimos nossas vidas, mas muitas vezes, o destino, a história, o poder dessa história em nós – reparem como as histórias que Oto (esposa de Yusuke) contava para ele nunca deixam de o afetar – são aquilo que de fato comandam e nos dirigem, a questão é se nos deixamos ser dirigidos por fatores externos.

Nem sempre devemos deixar fatores externos terem controle sobre nós, mas as vezes é inevitável e o jeito é se deixar dirigir e ir até onde o carro em questão te levar. “Drive my car” nos mostra que na inevitável e infindável busca por carinho, nós não temos nenhum controle e não há nada de errado nisso.

Texto que faz parte da cobertura da edição 2021 do Festival de cinema de Chicago

This critic is part of Chicago Film Festival 2021 coverage

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