Imagem: DIVULGAÇÃO |
Em dado momento de “Um herói”, novo filme de Asghar Farhadi,
eu lembrei de seu – possivelmente – melhor trabalho, “A separação”, obra na
qual fiquei o tempo inteiro me perguntando como toda aquela situação não tinha chegado,
em nenhum momento, até o conflito físico entre alguns dos personagens homens.
Para mim, esse confronto era inevitável e felizmente Farhadi não usou essa
solução para sua história.
No novo trabalho do diretor iraniano, temos sim, brigas
físicas, mas, ao contrário do filme de 2011, eu pensei que a situação
apresentada pelo diretor era facilmente resolvível através de uma conversa.
Isso porque é algo bem simples, que foi tornado complexo pelas pessoas
envolvidas. Rahim, um homem que saiu temporariamente da prisão e foi ver sua
família, acha uma bolsa com moedas de ouro e após tentar vender o conteúdo (e
falhar), ele decide devolver a bolsa para a dona. Ao devolver, o homem fica
famoso por ter sido, pura e simplesmente, honesto.
O que revela duas coisas: a honestidade está em falta e como
as pessoas criam, frequentemente tempestade em copo d’agua. Claro, Rahim
poderia ter pagado sua dívida com o dinheiro (dívida essa que é o motivo dele
estar preso), mas escolheu, após falhar na venda do ouro e interpretar isso
como um sinal, fazer o mínimo e retornar a bolsa para sua dona.
Digo “fazer o mínimo”, pois Farhadi faz algo que sempre fez
em seus filmes (com exceção de “Todos já sabem”), ele mostra como pessoas podem
ter pontos de vista diferentes e estarem certas em suas opiniões sobre o mesmo
assunto. Isso soou centrista, mas não tem como o espectador culpar o credor de
Rahim por querer o dinheiro de volta, da mesma forma que o protagonista usar o
filho pequeno como forma de comover as pessoas e fazerem essas sentirem dó
dele, é algo no mínimo questionável.
Farhadi joga essas opiniões conflitantes em seu filme de
maneira organizada, onde assim como em uma situação na vida real, os fatos e
opiniões não são expostos ao mesmo tempo, cada pessoa tem sua própria agenda e
nunca põe o interesse do outro acima de seus próprios. É uma competição
socialmente aceita por todos nós, que competimos basicamente o tempo todo.
Para perceber isso, é só prestar atenção em como a direção
da prisão muda com Rahim após a devolução da bolsa e da “fama” dele, como a
associação que media sua condicional também muda após uma série de fatos
envolvendo dinheiro e como Rahim tenta se manter firme em meio a tudo aquilo.
Vemos que ele acredita em sua honra e honestidade, quando
ele se vê amparado por várias pessoas (inclusive as citadas acima) ele acha que
é o único certo, então, quando a situação muda e ele percebe que cada um dos
envolvidos tem interesses próprios, Rahim parece ter dificuldades de adaptação
a nova situação apresentada.
Esses interesses próprios, assim como as opiniões
conflitantes e certas citadas acima, também são válidos. A associação mediadora
não pode ajudar Rahim se esse impede (involuntariamente) eles de fazerem seu
trabalho (ajudar presos e suas famílias), da mesma forma que a direção da
prisão, que estava em busca de fama, não pode largar a administração da
penitenciaria, para, pura e simplesmente ajudar o protagonista.
Da mesma maneira que o credor precisa ser pago, porque sem o
dinheiro, como é que ele vai viver e pagar as contas? No fim, ter seus próprios
interesses não é o problema, o problema é quando eles entram em conflito.
Pensando em “A separação”, a briga é apenas argumentativa, em “Um herói” essa
briga avança para o físico, quando o desespero dos envolvidos é tão forte, que
eles externalizam isso do único jeito que julgam possível.
Assim, ficamos pensando o tempo inteiro em quem está certo
ali e principalmente, qual lado assumir, sentimento despertado em outros filmes
do diretor. Ao que tudo indica, “Um herói” pode ser o retorno de Asghar Farhadi
aos bons trabalhos, após “Todos já sabem”, sabíamos que o próximo filme seria
melhor. Agora, é esperar o próximo.
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