Imagem: DIVULGAÇÃO |
Levando em consideração que vivemos em um mundo cada vez mais acelerado, onde não paramos em quase nenhum momento, filmes como “Diários de Otsuga” são um alívio, pois nos faz pensar nesse ritmo e na efemeridade de tudo ao nosso redor, inclusive de nós mesmos e de nossos trabalhos.
Digo isso porque estruturalmente falando, o filme de Miguel
Gomes e Maureen Fazendeiro ao mostrar os seus diários a partir do último dia,
expõe como tudo de fato passa, ou ao menos passou para os envolvidos naquela
filmagem, que durou alguns meses em um local aparentemente isolado em Portugal.
Se tudo passa, é interessante ver como a relação entre os envolvidos foi construída. Fazendeiro e Gomes começam seu filme com uma festa na qual tem apenas três pessoas e elas aparentam se dar bem, mas será que se dão mesmo? O que eles passaram para chegar até aquele ponto, naquele contexto?
Por esse motivo que a estrutura invertida do diário
funciona, pois percebemos que eles passaram por diversas situações, tanto boas
quanto ruins, para chegar até aquele ponto escolhido pelos diretores para ser o
começo do filme, percebemos que os sentimentos claros já no início, sempre
estiveram presentes naquelas pessoas, eles estavam apenas escondidos.
Esconder sentimentos no começo de um relacionamento de
trabalho é até algo natural, uma cautela que pode ser considerada necessária,
principalmente em algumas áreas de atuação. Logo, ver aquelas pessoas se
aproximarem com o tempo é algo facilmente identificável com a situação do
espectador em casos parecidos.
Com certeza, isso aumenta em uma pandemia, como a que
estamos vivendo com o Covid-19. Não sabemos de onde as pessoas vieram e o que
elas pensam sobre assuntos socialmente relevantes, como, por exemplo, a vacina.
Não a toa um dos pontos de conflito no filme e afastamento da equipe é
justamente um debate sobre a quebra de isolamento.
O que tem efeito potencializador em relação ao último dia
retratado no filme e ao primeiro dia oficial do diário. Quando nós chegamos em algo
ou conhecemos algo/alguém novo é sempre muito bonito, porque criamos em nossas
cabeças uma ideia de perfeição, que sabemos ser inexistente por motivos óbvios,
mas que criamos porque temos a esperança de que dessa vez essa perfeição, essa
ideia, seja real.
A questão é se nós estamos dispostos a lidar com isso quando
temos a quebra dessa idealização. No último dia de filmagens é uma festa, no
primeiro? Também. É curioso como essa decisão é até previsível, justamente por
essa ideia de perfeição, pois, por que não fazer algo para comemorar? Eu não
concordo com a ideia de uma festa em uma pandemia, porém, com todos eles
testados negativo (como foi dito que estavam) é natural que as pessoas façam
coisas assim, por puro e simples alívio e lembrança de um tempo no qual nem imaginávamos
uma coisa dessa acontecendo.
Maureen Fazendeiro e Miguel Gomes constroem essa perfeição aliada a efemeridade muito bem em “Diários de Otsoga”, pois algo perfeito ou não existe ou acaba logo. E nesse caso, como na maioria das situações em qualquer contexto, a perfeição não existiu.
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