12/21/2021 08:06:00 PM

Crítica: Matrix Resurrections

Matrix Ressurections
Imagem: DIVULGAÇÃO
Todo mundo precisa de um recomeço. Fiquei com esse pensamento na cabeça durante todo “Matrix Resurrections”, vivemos um momento difícil, pessoalmente e socialmente. A gente quer recomeçar, quer uma segunda chance, quer conseguir viver novamente e na maioria das vezes, não vamos conseguir.

Lana Wachowski precisou de um recomeço e o encontrou na arte. O que vemos nesse filme é não apenas uma ressureição no título, mas dois personagens que ajudaram a diretora a lembrar que existe vida fora da tristeza, tem amor, há esperança e algo no qual podemos nos agarrar.

Acompanhamos esses dois personagens, Neo (Keanu Reeves) e Trinity (Carrie-Anne Moss) em uma Matrix ordenada até demais, onde Neo é Thomas Anderson (seu nome antes da pílula vermelha e trabalha como criador de jogos e Trinity é Tiffany, uma mulher comum vivendo na cidade grande. Neo está sempre em questionamento consigo mesmo, até que um erro em um programa, causado por Bugs (Jessica Henwick), faz ele entrar novamente no mundo real e o redescobrir.

“Redescobrir” porque ele escolheu recomeçar de maneira diferente, se afogando, de certa forma, na tristeza, após o final de "Matrix Revolutions". Tomando a pílula azul constantemente, ele passa a viver na simulação e na tristeza, como se a vida fosse aquilo e exclusivamente aquilo.

Wachowski trabalha isso não através da melancolia, mas sim através da parodia (principalmente na primeira hora), onde vemos coisas relacionadas aos outros filmes, citados inclusive pelos personagens novos, através das piadas, “Matrix foi feito para agradar crianças”, como se fosse Wes Craven dirigindo um filme de ação.

A diretora não tem medo de assumir a fantasia que move Matrix e transmite as ideias que ela (e Lilly até o filme 3) criaram para o público. Talvez por isso tenhamos a impressão de vermos um filme completamente diferente na segunda hora, mas na verdade, estamos apenas vendo Lana Wachowski ser Lana Wachowski, ou seja, vemos o sentimento e a valorização dele dentro do recomeço buscado pela diretora e por seu protagonista.

Eles buscam o amor, a lembrança do amor, a ressureição do amor, a salvação de si mesmo dentro desse sentimento tão belo e ao mesmo tempo tão complexo. As cenas de ação, coloridas como as de Matrix costumam ser (por mais que menos do que nos filmes anteriores), são lutas não apenas lindas visualmente, mas também representam o amor que cada um daqueles personagens busca.

Morpheus (Yahya Abdul-Mateen II), mantem sua crença e amor pelo Escolhido, o sócio de Neo na simulação (Jonathan Groff), luta pelo amor por si mesmo, Bugs briga para expressar seu amor, sua fé, não apenas em relação a Neo, mas também em relação as escolhas criadas por aquele mundo e Neo luta por Trinity.

Foi Trinity que acreditou em Neo nos momentos complicados, ele não acreditava ser o que é, ela sim, ele não pensava que fosse capaz de unir e conciliar humanos e máquinas, ela nunca duvidou. Os pais de Lana e Lilly Wachowski, com certeza acreditaram nas filhas em cada trabalho, cada projeto, cada coisinha que elas faziam. Essa crença do outro em você é o motor de nossas vidas, precisamos que alguém acredite na gente, nos bons e maus momentos.

Por isso que Neo decide recomeçar, nunca foi por ele, sempre foi por Trinity, o público sabe disso, sentimos isso em cada piada, em cada ironia ao que o mundo se tornou – “você trouxe a merda do Facebook e a porra da Wiki, porque?” – diz um certo personagem em dado momento e nós sabemos o porquê, porque se faz o necessário por quem se ama e por quem acredita em você, não importa o sacrifício.

Em geral, recomeçar é sacrificante e penoso, você se desafia, constantemente, você se força. Neo se forçou a rever coisas e pessoas que ele não queria, mesmo numa roupagem nova. Lana Wachowski, me colocando no lugar dela em relação a perda dos pais, deve ter se forçado a rever o mundo com outros olhos e sem duas das pessoas que mais ama ao seu lado. A vida é um desafio, sempre.

A plasticidade das cenas vem em um momento no qual esse tipo de coisa não é exatamente bem-vinda em um blockbuster. Não apenas porque, como já dito, elas são coloridas, elas entretêm, fazem com que o público se envolva e fique empolgado, se arrepie, da mesma maneira que em outras cenas nos emocionamos e até choramos porque nos colocamos naquele renascimento, mas porque essas cenas têm em si, a ideia do recomeço e hoje em dia ideias não são bem-vindas.

Felizmente, Lana Wachowski acreditou em si mesma, no amor que sente pelos seus pais, no amor que Neo e Trinity deram a ela e isso a fez recomeçar. Ela precisava lembrar, provavelmente (quem sou eu para assumir algo assim), o que a fazia sentir tesão pelas coisas, o que a fazia sentir vontade de fazer cinema, assim como eu, no início desse ano, precisei me lembrar do que me fazia sentir vontade de escrever.

Eu escrevo porque meus pais me leem. Provavelmente, Lana Wachowski começou a fazer cinema porque os pais dela assistiam aos filmes dela e de sua irmã. E se “o amor é a gênese de tudo”, como vemos nos créditos de “Matrix Resurrections”, nada mais bonito e desafiador do que recomeçar usando a sua origem como ponto de partida. 

Um comentário:

  1. Esse filme foi o mais esclarecedor de todos. As referências aos filmes anteriores são fundamentais e a crítica específica o contexto.
    Gostei muito 👋🏾👋🏾👋🏾👋🏾

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