7/05/2023 09:00:00 PM

Crítica: Missão Impossível - Acerto de Contas

Missão Impossível - Acerto de Contas
Imagem: DIVULGAÇÃO / Paramount Pictures

Muito é dito sobre Tom Cruise ser o Buster Keaton dos nossos tempos. Assim como o astro do cinema mudo, Cruise faz coisas mirabolantes e as filma com uma qualidade extrema e em “Missão Impossível: Acerto de Contas – Parte 1” isso acontece novamente.

É interessante pensar que o vilão do filme dirigido por Christopher McQuarrie e com Cruise como o já conhecido protagonista Ethan Hunt, é uma inteligência artificial que criou consciência própria e usa humanos para cumprir o seu propósito, que é impedir que uma chave, cujo aquilo que ela abre ninguém sabe o que é, vá parar na mão de governos estrangeiros e claro, nas mãos de Hunt.

Digo isso porque hoje em dia estamos de certa forma cada vez mais ligados com as inteligências artificiais, principalmente o chatgpt, cuja Entidade (nome dado a inteligência do filme) claramente emula, mas, como Hunt enfrenta um vilão que fisicamente falando não existe?

Talvez esse seja o maior desafio do filme, o expor essa luta do digital contra o físico, do online contra o offline. McQuarrie e Cruise o enfrentam tornando o filme uma espécie de “Batedor de Carteiras” (de Robert Bresson) e “A General” (de Buster Keaton), onde a ação é elegante e o ritmo torna o filme uma viagem pelas mãos das pessoas que em algum momento tiveram a chave em mãos.

Com os closes nas mãos dos personagens, percebemos como nada é o que parece e o que pode estar na nossa frente, na verdade, está perdido, separado em muitos dos casos, por nós mesmos e no caso do filme, pelo próprio Ethan Hunt, que pela primeira vez se encontra indefeso, incapaz de agir da maneira puramente instintiva a qual é o seu costume.

Em “Missão Impossível: Acerto de contas – Parte 1”, Hunt, assim como o público, precisa pensar antes de agir, a racionalização precisa tomar o lugar do instinto. Isso fica muito claro após a sequência em Veneza, que tensa como poucas cenas de ação conseguem ser, expõe o desafio que Hunt enfrenta.

Essa sequência em Veneza não apenas é importante para esse filme, mas também para a trajetória de Hunt em sua totalidade, pois ela representa as perdas que o agente secreto enfrentou nos filmes passados. Claramente uma referência ao primeiro filme, a cena escura, em uma ponte, é Hunt precisando escolher, é ele em dúvida, ele preso a um caminho inevitável de escolhas ruins.

Assim como, muitas vezes, nós estamos nessa mesma ponte, precisando fazer escolhas difíceis e sabemos que independente do que escolhermos, o final não será bom. Parece que assim como Hunt, nós, pessoas comuns e completamente sem capacidade se nos compararmos a Tom Cruise, sempre enfrentamos dilemas dentro de nossos caminhos.

McQuarrie escolhe trazer essas dúvidas a tona para que, talvez, Ethan Hunt possa se aproximar do público, para que este sinta empatia pelo agente secreto e isso tem por consequência direta fazer a gente sentir o que precisa sentir para que “Missão Impossível: Acerto de Contas – Parte 1” funcione.

E a gente precisa sentir a tensão da entrada ou não de um trem, o humor involuntário (que é uma homenagem consciente a Keaton, imagino) de um carro pequeno rodando em uma praça durante uma perseguição, o silêncio das cenas de ação, (como a cena no deserto) e como esse é preenchido pelo sentimento de medo de um futuro onde a informação, a verdade e a busca por recursos mínimos a vida se tornam os principais motivadores de uma guerra.

Guerra essa onde perderemos, inevitavelmente, pessoas que gostamos e até mesmo amamos. Para superar essas perdas, nos apoiaremos em coisas nas quais somos bons, mas que podem ser extremamente punitivas para gente, no caso de Hunt, as missões impossíveis, no nosso caso pode ser qualquer coisa.

Tudo é meio abstrato em “Missão Impossível: Acerto de Contas – Parte 1”, porque uma vida onde precisamos o tempo todo fazer escolhas difíceis é abstrata. O amor, a amizade, os bons sentimentos no geral, são abstratos e às vezes nós conseguimos montar esse quebra cabeça de algum jeito e aqui, sim, a montagem é puramente instintiva, assim como Hunt gosta que seja.

E às vezes nós não conseguimos montar esse quebra cabeça e sobram poucas coisas para nos apoiarmos. Para Hunt, pode ser o sorriso de Grace (Hayley Atwell), o olhar penetrante de Ilsa (Rebecca Ferguson) ou sua amizade com Luther (Ving Rhames), o que importa é ter algum lugar para pousar após pular de paraquedas.

E o que importa para nós, espectadores, é que tenhamos um lugar para pousar quando as coisas derem errado. Talvez essa seja a missão impossível de cada um.

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