Imagem: Sony Pictures |
Na sequência de um filme de sucesso no gênero ficção
cientifica há uma dificuldade que pode se tornar uma facilidade, isso é, caso a
obra esteja na mão de um diretor competente. É o seguinte: usar a amplitude do
universo a favor da obra, para aprofundar uma história já conhecida, fazendo o
ambiente crescer de maneira gradual.
Em 1982, “Blade Runner” de Ridley Scott, surpreendia o
mundo, seja por trazer um Harrison Ford já conhecido em seu papel principal ou
pela criação e consolidação do que iria se tornar o nosso futuro em
quase todos os aspectos. É uma obra que explora muito bem as relações
interpessoais.
Aumentar esse ambiente não é tarefa fácil, pois o que foi
criado por Scott já era amplo o suficiente para um filme, assim Denis
Villeneuve foi uma escolha acertada, é um diretor competente em vários tipos de
projeção, mantém um nível de qualidade alto em toda a sua carreira fílmica e
assume o projeto após um filme de ficção cientifica de sucesso e inventividade
que é “A Chegada”.
Por isso, percebemos a dificuldade que ele teve em “Blade
Runner: 2049”, pegar uma obra de sucesso, não criada por ele, e potencializar a
vastidão de um universo muito bem construído. Felizmente, o nível de qualidade
de Villeneuve foi mantido e temos uma sequência possivelmente melhor que o
filme original.
A obra conta a história de “K” (interpretado por Ryan
Gosling), replicante da nova geração (Nexus 8), que caça replicantes da velha
geração – os sobreviventes daquele período de quatro anos de vida abordado no
longa de 1982, acontecimento conhecido como blecaute – e aqueles robôs da
geração nova considerados desobedientes. Em uma missão, o rapaz descobre algo
capaz de mudar todo o panorama mundial, e por conta disso, passa a procurar o
policial Deckard (Harrison Ford) que está desaparecido desde o fim dos eventos
do primeiro filme.
Villeneuve, como tradicional de sua obra (basta assistir “A
Chegada”, “Os Suspeitos” e “Sicário” para a confirmação desse pensamento) cria
um filme complexo, usando os aspectos técnicos, enriquecendo a história e
completando o sentido desta. Percebemos isso pelo uso da fotografia, da
montagem e dos ângulos de câmera utilizados.
A fotografia é o que faz o filme bonito visualmente, graças
a habilidade do brilhante Roger Deakins, percebemos cores em tons fortes, independentemente
de quais sejam os matizes utilizados, se um cômodo é escuro, ele parecerá mais
escuro apenas com o objetivo de ligar esse sentimento com o do personagem que o habita,
se o local é claro há duas coisas a serem notadas, uma é que este costuma ser
um ambiente externo (um lugar da cidade, uma rua, uma floresta) e a sensação denotada pela cor, seja felicidade ou uma determinada euforia por estar
perto de descobrir algo.
Já na montagem a opção feita foi a da utilização de planos
longos e poucos cortes, assim o espectador cria identificação com o personagem
de Gosling (o protagonista desse filme) e o suspense, a curiosidade são
despertadas, prendendo a atenção daqueles que assistem.
Está ligado a montagem os ângulos de câmera. Usando com frequência o plongeé (de cima para baixo) a obra sempre parece remeter a altura que
domina aquele universo, os carros são voadores, os prédios são altos, os
personagens são enquadrados para aparentarem altura e a escolha por esse ângulo
cria a confirmação da altivez do roteiro.
Roteiro esse que não é apenas uma simples história de
pessoas caçando robôs (ou de robôs caçando robôs). Ao longo de suas quase três horas de duração, vemos uma
jornada de autoconhecimento e descobertas que K passa, somos convidados a
enxergar tudo pelo ponto de vista dele, uma ferramenta que a projeção utiliza
com inteligência, já que isso consiste em um dos pontos de surpresa para um
espectador já imerso.
Isso se deve a grande performance de Ryan Gosling, apesar da
falta de expressão e do jeito sisudo, a decisão do uso dessa abordagem pelo
ator se mostra correta. Quando ele pensa que determinada coisa não é real, o
público acredita nisso, e se ele passa a sentir, ou a mudar de atitude, a ideia
é vendida com facilidade ao espectador.
O elenco não conta apenas com essa grande interpretação, Ana
de Armas como Joi, convence de todas as formas possíveis, devido a seu humor
leve, a perspicácia aliada a observação e claro, a identificação nutrida em seu relacionamento com K, criando uma dinâmica bacana entre os dois
personagens.
Em determinado momento de BR: 2049, lemos a seguinte frase “
O que você quer ouvir, o que você quer ver”, a obra pode ser definida a partir
desse dizer, se por um lado o filme é o que você deseja ouvir e ver, por outro
não é nada disso. E fica claro por essa pequena antítese, que Blade
Runner: 2049 é justamente o que Denis Villeneuve intencionava fazer: criar uma
obra rica, eficaz, remetendo a uma projeção de sucesso e levando algo novo para
o cinema. E, claro, ele conseguiu.
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